sexta-feira, 12 de junho de 2009

Teatro- Retrospectiva 2008 - Macksen Luiz

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(retrospectiva publicada no Jornal do Brasil, 25 de dezembro de 2008)

sábado, 6 de junho de 2009

. O estrangeiro - matéria

em breve

. O estrangeiro - Danielle Avila

Uma verdade ainda negativa

(foto de ensaio)



O estrangeiro, peça em cartaz no Mezanino do Espaço SESC, é uma adaptação de Morten Kirksov para o romance homônimo de Albert Camus, com tradução de Liane Lazoski. Em cena, Guilherme Leme, que assina a direção junto com Vera Holtz, conta a história de seu personagem, Mersault, na primeira pessoa. Mersault é, a princípio, um homem comum. Aos poucos, percebemos que algumas fronteiras entre o comum e o incomum se romperam e que o limite entre o espaço do indivíduo e o espaço da sociedade está sendo apresentado como algo bastante complexo.


Nos momentos iniciais da peça, antes que o ator comece a contar a sua história, o espaço cênico se mostra como um espaço de tensão. O cenário de Aurora dos Campos e a luz de Maneco Quinderé formam uma câmara de pressão, condensam uma atmosfera - mas o agente dessa pressão, dessa condensação, não é facilmente identificável. Com elementos mínimos, o cenário constrói a sua presença e se coloca como interlocutor para o discurso de Mersault. É como se a visualidade do espetáculo expressasse a força do que está fora do universo particular do personagem.


A cena reflete a clareza do pensamento de Mersault. Assim como a escrita do autor, a encenação é refinada e sedutora. A beleza que provoca uma aproximação contrasta com o conteúdo da fala do personagem, que pode provocar aversão. A atuação de Guilherme Leme dá a ver a trajetória do personagem com a mesma premissa de contrastes: ele articula suavidade e rudeza, num jogo de sobreposição das duas forças.


Parece que a encenação apenas procurou criar uma ambientação que focasse na subjetividade do personagem, na reflexão que se pode ter a partir das suas afirmações, de forma que a conquista mais interessante da montagem parece ser a reverberação das idéias em jogo no texto. Isso acontece na medida em que a encenação se coloca como agente daquele discurso, sem parcialidades, fazendo um convite ao ajuizamento. A peça faz pensar sobre Mersault.


Então, me vem ao pensamento que talvez Mersault seja um parente - um pouco distante, mas talvez parente - do Bartleby de Herman Melville. Em seu ensaio sobre Bartleby, Gilles Deleuze aponta que a novela de Melville forma uma linhagem subterrânea com outras de Kleist, Dostoievski, Kafka e Beckett. Arrisco sugerir que o texto de Camus também faça parte desse parentesco obscuro.  O "Tanto faz" que Mersault repete se aproxima do "I am not particular" do Bartleby. Há algo que Deleuze diz deste último que talvez sirva a Mersault: "É liso demais para que nele se possa pendurar uma particularidade qualquer." E ainda:"Petrificados por natureza e que preferem... absolutamente nenhuma vontade, um nada de vontade e uma vontade de nada (...). Só conseguem sobreviver tornando-se pedra, negando a vontade, e se santificam nessa suspensão." (DELEUZE, 1997:92)

Em O estrangeiro, vemos a jornada de Mersault nesse processo de santificação às avessas: ele descobre a sua verdade, "uma verdade ainda negativa", nas palavras de Camus, a sua verdade feita de "não", de uma recusa que não é indiferente, mas comprometida e internamente coerente. A recusa de Bartleby (sua verdade também negativa) vai ao cúmulo da passividade, enquanto a de Mersault se resume a um ato extremo e sua conseqüente condenação. Ambos, cada um a seu modo, subvertem a lógica do entorno com a recusa a compartilhar seus pressupostos. E assim complexificam o pensamento sobre a vida.


                                                      ***


Por fim, talvez caiba aqui um comentário sobre o fato de que o espetáculo foi dirigido por Vera Holtz, que nunca tinha trabalhado como diretora. Há bem pouco tempo, esteve em cartaz no Rio uma peça que também foi dirigida por uma atriz: Apropriação, primeira direção de Bel Garcia. A experiência artisticamente bem-sucedida destas peças parece sugerir que uma ocasional troca de funções pode operar deslocamentos nos pressupostos estéticos dos artistas que se propõem a tais mudanças, e que, talvez, sair do seu lugar seguro de expressão artística possa cavar novos canais para refinar a voz pessoal de cada um.


Referências bibliográficas:
DELEUZE, Gilles.
Crítica e clínica; tradução de Peter Pál Pelbart. - São Paulo: Ed. 34, 1997. (Coleção TRANS)
MELVILLE, Herman.
Bartleby, o escrivão - Uma história de Wall Street; tradução de Irene Hirsch. São Paulo: Cosac & Naify, 2205.


(crítica publicada na revista eletrônica questão de crítica publicada em 24 de fevereiro de 2009)

www.questaodecritica.com.br

. O estrangeiro - Lionel Fischer

Obra-prima em versão imperdível 


Lionel Fischer 


“A minha mãe morreu hoje. Ou talvez ontem, não sei bem. Recebi um telegrama do asilo: ‘Mãe faleceu. Enterro amanhã. Sentidos pêsames’. Isto não quer dizer nada. Talvez tenha sido ontem”. Assim começa aquele que muitos consideram como o melhor romance de Albert Camus (1913-1960), “O estrangeiro”, que agora chega à cena (Espaço Sesc) com adaptação de Morten Kirkskov, tradução de Liane Lazoski, direção de Vera Holtz e Guilherme Leme, e interpretação deste último. 


De fato, trata-se de uma obra extraordinária, protagonizada por um homem (Meursault) apagado, modesto, que ama a vida nas suas facilidades fáceis, não sentindo nenhum dever para com a sociedade onde não tem qualquer papel, e tanto mais espontaneamente silencioso quanto é certo que pouco tem a dizer. Em resumo: ele é a materialização da simplicidade – ou da insignificância. Mas algo o distingue de todos: a sua inaptidão profunda para a mentira, o que lhe confere grandeza e, ao mesmo tempo, acarretará sua perda. 


A narrativa se apóia em três momentos. No primeiro, Mersault vela o cadáver da mãe, fuma, toma café; e no dia seguinte, não chora no enterro. No segundo, em um incidente para o qual não encontra explicação – e nem julga possível haver uma explicação seja para o incidente como também para muitas outras coisas – mata um árabe a tiros de revólver – já no primeiro disparo, o árabe tomba morto, mas Mersault lhe dá ainda mais quatro tiros. E finalmente, é julgado por seu crime e condenado à morte. 


E é justamente neste terceiro momento que reside o essencial. Na realidade, Mersault não é condenado exatamente por seu crime, mas por negar-se a se comportar de acordo com as normas vigentes, por recusar-se terminantemente a usar a máscara da hipocrisia e assim representar o papel de cidadão em sintonia com a sociedade em que vive. Em resumo: Mersault morre não por ter matado alguém, mas por não haver chorado no enterro de sua mãe, este sim um crime realmente intolerável... – qualquer sociedade consegue conviver razoavelmente com algumas diferenças, mas não com um “estrangeiro” aos seus valores essenciais. 


Apoiados em uma adaptação impecável, que consegue condensar em uma hora de espetáculo toda a densidade do romance, e em irretocável tradução, os diretores criaram uma montagem irrepreensível sob todos os pontos de vista, cabendo ressaltar a austeridade e secura dasmarcações, todas elas voltadas para explicitar o mais possível os principais conteúdos e idéias do autor. 


Com relação a Guilherme Leme, este exibe performance notável, alternando momentos de contenção (a maioria) com alguns poucos em que o personagem expõe sua perplexidade e revolta de forma mais incisiva. Trata-se, sem dúvida, de um trabalho de ator que merece ser aplaudido sem restrições, posto que construído a partir de escolhas plenas de inteligência e sensibilidade. 


No que concerne ao restante da equipe técnica, destacamos com entusiasmo a refinada iluminação de Maneco Quinderé, que através de alterações sutis consegue enfatizar todos os climas emocionais em jogo. Também merecem aplausos a cenografia de Aurora dos Campos, a trilha e música incidental de Marcelo H, a preparação vocal de Maria Silvia Siqueira Campos e a preparação corporal de Miwa Yanagizawa.


(crítca publicada no dia 15 de fevereiro de 2009)

www.lioner-fischer.blogspot.com

* foto de André Gardenberg

. Cuconovolândia - Quadrienal de Praga 2007

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(matéria publicada na revista Espaço cenográfico 31º edição)
www.espacocenografico.com.br

. Eu que poderia ser eles - Aurora dos Campos


Já ela com mania de colecionar coisas dos outros, dos outros que já passaram.

A síntese do que ficou daqueles que já foram.

E que voltam a cada vez que ela abre o saco preto cheio de lixo rico.


 Norfolk, 26 de agosto de 1952.

Prezada nilcéia:

Há muito tempo penso em vocês com saudades e com intenção de fazer uma cartinha, porém como sou a secretaria do Nó, tenho sempre muita coisa a fazer e por isto fico em falta mesmo com os parentes e amigos queridos.

Naturalmente titia tem falado sobre nós, e vocês já estão mais ou menos ao par da nossa vida nos E.U.A...

Depois de muito viajar (o que aliás adorei) fomos mandados para cá. No princípio estranhei, mas agora já estou bem familiarizada com tudo e até falando inglês... 

A Sheila está muito gordinha, porém muito saudosa da Teté. Gosta mais do Brasil...

O Noisio está bem mais gordo, e com saúde graças a Deus.

Há uns 15 dias que está no mar; não é horrível? Já não suporto mais de saudades...

Tenho gostado daqui. A vida é facílima. A nossa casa é um amor, e tem todo conforto possível. É um prazer ir a cozinha, pois ela é linda! A peça mais importante de uma casa é esta.

Como vão vocês ai? E Princesa? Sempre com a lingüinha de fora? Quais as novidade do Rio? Hoje amanheci com "Home sick"...não deixa de ser triste estar longe do Brasil.

O comandante comprou um carro alinhadíssimo; é o segundo amor da vida dele... como recebe carinho o Chrysler!...

O frio já está se aproximando; infelizmente!

Domingo tivemos 12 graus... Pobres brasileiros..

Dizem que chega a fazer 25 graus abaixo de zero...

Talvez eu me transforme num gostoso "Ice cream".

Esta cidade é bem grande. Tem vários cinemas e um comércio formidável (é ai que fico tonta).

A base Naval é outra cidade de tão grande. O transito de  automóvel até impressiona de tão movimentado. Tem uns 8 ou 10 clubes, lojas, igrejas, correios, bares, cinemas, mercado etc, e tudo mais barato. Fica uns 10 ou 15 minutos de carro da nossa casa.

Norfolk tem boas praias. Uma bem alinhada que eles querem comparar com a nossa Copacabana; mas não é possível... Ela é maior, tem mais movimento, mas não tem beleza nem edifícios altos.

Bem Nilcéia vou terminar esperando que você me responda em seguida. Uma carta do Brasil é um verdadeiro prêmio pra mim. Um abraço no Ernani e para você muitas saudades da prima amiga.

Isis.

 

Hoje é dia 6 de agosto de 2008, ela está com quase 25 anos e mora com uma amiga da mesma idade. Está nublado no Rio, mas não faz calor e nem frio. Tem rádio com música clássica na sala, e lembranças de outras pessoas espalhadas pela casa. Ela anda descobrindo algumas coisas nesse ano que está morando sozinha, por exemplo: as comidas que elas mais compram é banana, granola e abobrinha. Curioso né?

Ela acabou de chegar de Norfolk, passou um tempo lá, talvez 15 minutos parece mais. Descobriu o carro Chrysler, que  já tinha visto em filmes. Gostou da parte da carta em que Ísis diz:"A nossa casa é um amor, e tem todo conforto possível. É um prazer ir a cozinha, pois ela é linda! A peça mais importante de uma casa é esta.." Isis parece muito próxima, mas foi a primeira vez que ela soube de sua existência e seu nome. Ela está fazendo Direção de arte de um comercial de cuscuz nordestino, e tem que montar uma cozinha que seja ambientada na década de 50, então deu para sentir um pouco do amor de Isis por sua cozinha e ela acha que isso vai ajudar.

Agora ela procura Norfolk no mapa, na internet, e pensa em Isis com um grande Atlas.

Acredita que Isis tenha em torno de 30 anos e que Sheila gordinha seja sua filha e Noisio, da marinha, seu marido. Pensa que eles vivem agora naquele tempo. Eles poderiam ser seus personagens, mas ela não quer criar nada além das informações da carta. 


* Achei essa carta junto com umas velharias que estavam na mesma casa onde conheci o cofre laranja (texto que está pubicado abaixo). Totalmente embriagada pela texto do Felipe, Ele precisa começar, escrevi esse texto falando um pouco dela (eu) e dela (ela) e de tantos outros "eles" que existiram em tantos momentos.

. Considerações sobre o cofre - Aurora dos Campos



por Aurora dos Campos, cenógrafa da peça

o cofre
a questão do cofre
o peso do cofre
a porra do cofre
fiquei com vontade de escrever para Bachelard dizendo que a questão do cofre vai muito além do potencial do que ele tem dentro de si.
ele em si já nos pesou tanto que quase causou uma hérnia sem nem mesmo ser movido.
qual será a resolução do cofre?
ter ou não ter? eis a questão.
qual é o peso real do cofre?
para quem não sabe, ele é laranja, tem 1 metro de altura, está no canto de um quarto com piso de tacos, num terceiro andar de copacabana.
falando assim ele até parece ser bonzinho, mas o cofre não é bonzinho.
ele se encaixa na categoria das coisas especiais, que precisa de carregadores especiais, assim como o piano.
agora ele voltou a ser simpático, depois de saber que está na categoria de coisas especiais junto ao piano.
já o imaginei em vários cantos dessa sala, a multiuso.
já o vi parado, quieto, emanando um certo poder.
já o vi com várias pessoas em volta.
já o vi arranhando o chão de madeira.
já o vi numa espécie de patinete com rodinhas,
mas tem cabimento um cofre sobre rodinhas?
não, isso realmente eu não posso fazer com o cofre.
toda a majestade do cofre cairia no ridículo.
será que os Super Brasovs poderiam atravessar copacabana com o cofre no ombro?
será que o Super Café seria amigo do cofre?

carta ao cofre:

Querido Cofre,
escrevo para agradecer por você ter surgido na minha vida.
Apesar do trabalho que você me deu essa semana foi muito bom te conhecer.
Respeito ainda mais Vossa imponência, digo isso num tom de brincadeira mas é profundo o meu sentimento.
Escrevo num tom de despedida mas está difícil desapegar de você.
Passamos a semana falando sobre você.
Vou pensar numa maneira de te incluir na peça.
A verdade é que você já faz parte e mesmo que não possa comparecer fisicamente estará sempre nos nossos corações (nossa como estou sentimental).
Acho que isso é mesmo uma despedida.
Amanhã ainda vou ver quanto os carregadores especiais cobram para te remover (eles usam o termo remover).
Mas acredito que você não será removido.
Continuará ai no seu canto, estático e imponente como um cofre deve ser.
Agradeço também ao Eduardo, o novo dono do espaço onde você vive que iria nos ceder você gentilmente.
Escrevo também em nome da equipe do Ele precisa começar.
Deixaremos convites para a estréia, procure por Cofre + 1.
Obrigada,
Aurora dos Campos.

. Ele precisa começar

www.eleprecisacomecar.blogspot.com

. Quartos de Tennessee

em breve

. Quartos de Tennessee

em breve

. Quartos de Tennessee - Bárbara Heliodora

em breve

. Contando Machado de Assis - Bárbara Heliodora

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(crítica publicada em O globo em 11 de setembro de 2008)

. Contando Machado de Assis - Lionel Fischer

Emocionado tributo a um gênio

Lionel Fischer

Por muitos considerado o maior crítico literário da atualidade, o norte-americano Harold Bloom publicou, em 2002, um livro chamado "Gênio - os 100 autores mais criativos da história da literatura". E lá estava o nosso escritor maior, Machado de Assis (1839-1908), a quem Blomm dedica oito páginas de análise. Nada mais merecido, levando-se em conta a genialidade do "bruxo do Cosme Velho", tanto em seus romances quanto nos contos, ambos os gêneros repletos de obras-primas. Em vista disso, julgamos mais do que oportuna a presente empreitada.

Tendo como referências os contos "Missa do galo" e "Mariana", assim como fragmentos do romance "Dom Casmurro", "Contando Machado de Assis" é o atual cartaz do Centro Cultural Justiça Federal. José Mauro Brant e Antonio Gilberto assinam o roteiro, cabendo ao primeiro a atuação e ao segundo a direção do espetáculo.

Como se trata de obras muito conhecidas, não julgamos necessário resumir seus enredos. Mas torna-se imperioso destacar a forma encontrada pela dupla para contar as histórias selecionadas. E esta é aparentemente muito simples, ainda que tal simplicidade traga embutida dificuldades nada desprezíveis.

Em primeiro lugar, vemos em cena o próprio Machado de Assis, na pele do narrador - sem que isto implique em um figurino especial. Ao mesmo tempo, seus personagens ganham vida, dialogam, vivem intensamente as tramas, sempre como que "guiados" pelo autor. E o resultado é absolutamente encantador.

Vivendo o autor e todos os personagens, José Mauro Brant reafirma não apenas seu talento como ator, mas também como contador de histórias. E é realmente fascinante ver como o intérprete consegue, valendo-se apenas de variações indispensáveis, definir as múltiplas personalidades e os diferenciados climas emocionais em jogo. Um trabalho realmente notável, um dos melhores da atual temporada.

Quanto à direção, Antonio Gilberto impõe à cena uma dinâmica em total sintonia com as obras escolhidas, sem arroubos desnecessários ou marcas mirabolantes. Tudo acontece em um clima impregnado de delicadeza e elegância, pleno de emoção e poesia, e tais predicados tornam obrigatória uma visita ao Centro Cultural Justiça Federal.

No que diz respeito à equipe técnica, o trabalho de todos os profissionais envolvidos evidencia a mesma elegância, delicadeza, emoção e poesia acima mencionadas. Assim, só nos resta parabenizar, com igual entusiasmo, a cenografia de Aurora dos Campos, os figurinos de Ney Madeira, a iluminação de Tomás Ribas e a trilha sonora de Marcos Ribas de Faria.

. A forma das coisas - Alexandre Pontara

texto do aclamado e controverso diretor Neil Labute, inédito no Brasil, propõe reflexão sobre os experimentos da arte e sua influência no cotidiano.

(foto ensaio) 

Até onde estamos dispostos a ir por uma crença? Quais os limites que somos capazes de ultrapassar em nome do amor e de uma idéia? Que verdades omitimos dos outros e de nós mesmos para justificar nossos desejos? 

O espetáculo “A Forma das Coisas”, do dramaturgo e diretor americano Neil Labute (autor do bem sucedido “Baque”, encenado em 2005 no Brasil), e tradução de Marcos Ribas de Faria, em cartaz no Espaço SESC-Copacabana, traz à luz algumas respostas a respeito da interferência da arte no cotidiano e quais os efeitos transformadores que acarretam na vida de quatro jovens estudantes de uma universidade norte-americana. O texto se propõe a um exame das relações de amor, amizade, cumplicidade e os conflitos gerados a partir destes relacionamentos. 

Evelyn (Carol Portes) e Adam (Pedro Osório) são completamente diferentes. Ela é uma bela e arrojada estudante de Artes, prestes a concluir seu mestrado. Ele, um sujeito tímido e introspectivo, que trabalha como guarda do Museu da Universidade. O que a princípio poderia sugerir apenas uma comédia sessão da tarde, nas mãos de Neil Labute tem um certo sabor de provocação. A adaptação e montagem idealizada e dirigida por Guilherme Leme com co-direção de Pedro Neschling está impecável. Doses certas de humor e boas sacadas de interpretação dão o tempero que garante momentos de diversão durante o espetáculo. 

Os quatro atores que dividem o espetáculo parecem ter entendido a essência do trabalho de Labute e dão a tônica certa ao quarteto de amigos. Carol Portes está bem segura no papel de Evelyn, demonstrando coerência e talento na construção de seu personagem, garantindo os melhores momentos do espetáculo. Pedro Osório, indicado ao Prêmio Shell em 2001 por Trainspotting, em ótima atuação, consegue criar um Adam leve e tímido, transpondo para o palco a insegurança e os conflitos presentes na personalidade do personagem. A Diana, de Karla Dalvi, tem a carga dramática e a leveza necessária para fazer o contraponto com a personalidade da Evelyn defendida por Carol Portes. O explosivo Johnny, bem defendido por André Cursino, completa o quadro de atores. 

O ponto forte do espetáculo está na direção e concepção de Guilherme Leme que consegue construir um espetáculo com as cores certas de Labute. O espaço cênico é uma atração à parte e o cenário de Aurora dos Campos participa da construção da trama, se adequando e se transformando conforme o próprio Adam se transforma. A iluminação do grande Maneco Quinderé e a trilha sonora de Marcello H completam o trabalho do diretor, garantindo um espetáculo rico em conceito e plasticidade. 

Mais do que apenas discutir a arte, “A Forma das Coisas” propõe uma discussão sobre os limites da interferência do artista na vida das pessoas, o resto não se pode contar, correndo-se o risco de estragar a grande surpresa que o final do espetáculo trará.

(Coluna de Alexandre Pontara publicada na Seção Teatro (Rio de Janeiro) do Guia da Semana em 13/06/2008.)

. A forma das coisas - matéria Neil Labute

em breve

. A forma das coisas - matéria Aurora dos Campos

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(matéria publicada em O globo, 14 de junho de 2008)

terça-feira, 2 de junho de 2009

. A forma das coisas - Jefferson Lessa

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. A forma das coisas - Tania Brandão

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. A forma das coisas - Barbara Heliodora

A forma das coisas - Macksen Luiz

"A arte do criador que supera a vida da criatura"

Não por acaso, Neil Labute é roteirista e diretor de cinema. Sua dramaturgia, em especial A forma das coisas, com cenas curtas e cortes abruptos, encontra semelhanças narrativas com a linguagem cinematográfica nesta versão perversa de um Pigmaleão jovem. Neste caso, uma universitária que empreende, em nome da construção de realidade artística, a manipulação de sentimentos daquele que se tornará a consubstanciação de sua obra. Ao esculpir o outro, transforma seu ato em performance do processo de criação, cinzelando formas exploratórias de seu objeto de investigação como definitiva meta que se justifica por si mesma. Sem brechas, apenas com um sussurro ironicamente alentador no fim, nada detém a criadora que deseja provar, com sua escultura pulsante, que a arte ultrapassa a vida da criatura, depositária de emoções amoldáveis, material passível de ser considerado arte, apesar da cruel arquitetura dos seus meios, ou exatamente por usar tal método para existir como obra.

Neil Labute flagra esse microcosmo de uso mútuo. A seqüência de quadros, que evoluem como projeções de imagens editadas com economia de recursos e diálogos que reproduzem a linguagem direta de um roteiro de cinema, reforça a ligação do autor com a tela. Essa proximidade facilita o ritmo da narrativa, que corre com dinâmica seca, mas internamente tensa, e que, em diversos momentos, parece conduzir o espectador por pistas enganosas.

Guilherme Leme foi sensível ao mecanismo desse encaixe, desenhando a montagem seguindo as regras do jogo do autor. O diretor reforça os traços da escrita, deixando-os evidentes, como reflexos da manipulação da personagem, enquadrando a cena com "secura".

A tradução fluente de Marcos Ribas de Faria e o cenário de Aurora dos Campos colaboram para a "limpeza" da encenação. A cenografia, que usa elementos geométricos, que se tornam esculturas, camas, sofás, e que acumula objetos a cada quadro, compondo a instalação do fim, é inventiva na simplicidade. A iluminação refinada de Maneco Quinderé e os figurinos de Sonia Soares e Tatiana Brescia, que vestem adequadamente o elenco, completam com a trilha de Marcello H. o bom acabamento da montagem.

O elenco tem interpretações cuidadosas, em sintonia fina com o despojamento geral, marcadas por movimentos interiores e contenção externa. Karla Dalvi não caracteriza demais a loura, mais ou menos certinha, que descobre o papel de coadjuvante desempenhado no jogo. André Cursino transmite tanto a ambigüidade quanto a rudeza do amigo cheio de arestas. Carol Portes segura com firmeza a artista manipuladora. Pedro Osório se destaca como o tímido que é submetido ao projeto da namorada, com atuação inteligente e requintada.

(crítica publicada no Jornal do Brasil em 08 de junho de 2008)

. A forma das coisas - Lionel Fischer

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(crítica publicada no jornal Tribuna da Imprensa em 19 de junho de 2008)


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